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15 de out. de 2010

Maiakovsky e os trolls

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Há um tipo de artista -os polêmicos, os instigantes, os desafiadores- que atrai, como um ímã, as mais diversas espécies de pessoas, pro bem e pro mal. E justamente por serem polêmicos, instigantes, desafiadores. É natural: os chatos e os medíocres (i.e., medianos) não costumam ter muita audiência, quando muito tão chata quanto eles. O polêmico tem ibope mais alto, o que não quer dizer necessariamente que tenha mais qualidade. Muitas vezes a (falsa) polêmica é exatamente a arma do medíocre para aparecer, para ganhar a mídia e o mercado. Quem é bom -na área que for- não precisa disso. Aparece naturalmente, a polêmica que desperta, as reações -contra e a favor- vêm naturalmente. Pendurar melancia no pescoço é para os fracos.

Quando desperta a atenção (com qualidade, portanto), o indivíduo traz junto...a inveja. Vem no pacote. O medíocre, o que precisa da melancia no pescoço, vai justamente invejar quem não necessita de nada disso: e dá-lhe perseguição, críticas destrutivas, ou, como se fala aqui na web, trollagem. Isto é, a saudável prática de aporrinhar sistematicamente alguém.

27 de ago. de 2010

Nos portões do cemitério, com The Smiths

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"Cemetry gates" me remete a 1996, que foi quando ouvi "The Queen is dead" pela primeira vez. Comecei a ouvir os 80's não propriamente nos 80's, mas sim com quase uma década de atraso. Não faz mal: cá estamos nós, antes de irmos para o Empório, em Ipanema, ouvindo The Smiths derramando aquela poesia toda. Poesia mesmo: a letra, uma das mais líricas que já vi, é nada mais nada menos que um passeio, portas do cemitério adentro, por entre túmulos de antigos poetas. A voz peculiar de Morrissey (que vulgarmente chamamos de "estar com um ovo na boca") carrega no "Waaalllde", referência ao seu Oscar querido, ao passo que também Keats e Yeats aparecem, em espírito, pelo menos.

Oscar Wilde já é citado no blog, em uma postagem sobre seu "A alma do homem sob o socialismo". Era não apenas poeta e dramaturgo, mas também um sujeito politizado, como se vê; terminou seus dias humilhado e degradado, condenado que fora por sodomia, crime na Inglaterra vitoriana. William Butler Yeats (1865- 1939) foi um poeta irlandês, e John Keats (1795- 1821), inglês, ambos referências de Morrissey. As letras dos Smiths são sempre recheadas de referências literárias ou históricas, como por exemplo Joana D'Arc em "Big mouth strikes again" e Antônio e Cleópatra em "Some girls are bigger than others". Música culta e pop ao mesmo tempo, portanto, diferente das banalidades dos últimos 20 anos.

7 de ago. de 2010

Alguns poemas preferidos

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Demorei algum tempo até que tivesse saco para ler a "Ode marítima" inteira, de Fernando Pessoa sob o heterônimo Álvaro de Campos. E que coisa. Como alguém pode se lamentar tanto assim de algo que podia, mas nunca lera até então? A "Ode" é fantástica. É comprida -o que explica a falta de saco inicial- mas acaba por prender do início ao fim, e nos sentimos viajando pelos sete mares, sem sequer tirar os pés do cais do porto. Náufragos e ilhas desertas, barris de rum e almirantes, tudo está lá, todas as "coisas navais, velhos brinquedos de sonhos", e, por sobre tudo, Aquela, cujo espírito de bruxa dança, figuradamente, enquanto a carnificina pirata é consumada em alto-mar. Que imagem feminina linda. Cruel e sensual. Vejo então o quanto gosto de mulheres de espírito de bruxa.

Esse cenário marítimo nos leva, com o narrador do poema, ao delírio. Ele sente na carne o que é sofrer, e não só isso, o que é incutir, um ataque pirata. Nessa parte o poema se torna sanguinário e é preciso criar um Deus novo que dê conta disso, não um deus qualquer mas um "Deus dum culto ao contrário". Sentimos, junto com Álvaro de Campos, o que é ser o "pirata-resumo" e a "vítima-síntese", mas só até que o delírio passe: cá estamos de novo, defronte ao cais, olhando, serenos, o navio que se perde no horizonte.

6 de jun. de 2010

De cavaleiros templários

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Foi uma noite. Imbuído de melancolia, faço o que costumo fazer nesses momentos: leio o "Eu" de Augusto dos Anjos. Contraditório que seja, ler versos de tristeza, quando se está triste, é ter um pouco de alegria.  É ver que não se está sozinho. Daí, folheando as páginas, chego a "Vandalismo", um primor de poesia cruel. Cruel, e o próprio nome do soneto dá a pista- o vandalismo é o do despedaçar dos próprios sonhos, "no desespero dos iconoclastas". Mas que bela imagem, o contraste: primeiro Augusto nos apresenta as "catedrais virginais", com ênfase em sua pureza e beleza, para então acrescentar à cena a loucura do vândalo, que a tudo destrói. Como um estupro. E esse vandalismo, essa ofensiva aos "templos claros e risonhos", não se dá desacompanhada: conosco estão os "velhos Templários medievais".

Quem já leu "O pêndulo de Foucault", de Umberto Eco, com toda teoria da conspiração que permeia a obra, sabe que, no universo hermético -o do ocultismo- tudo se interliga de alguma forma. Não há acaso. O simpático padeiro pode ser membro de uma seita, assim como o colega de bar, sem que saibamos, um grão-mestre de alguma ordem obscura. Tudo sem que saibamos, sem que sequer desconfiemos. Eles, por sua vez, nos manipulam -a nós e à ordem mundial- e nos usam como joguetes de seus desígnios além da compreensão dos leigos. É nesse clima de conspirações que "O pêndulo de Foucault" se desenvolve, uma trama que confunde o leitor e o arrasta num turbilhão de suposições e suspense psicológico junto com o protagonista do livro, Casaubon. E, dentro do espírito do livro, o fato de Augusto dos Anjos ter incluído em seu poema os cavaleiros templários -um clássico do universo ocultista- não poderia ter sido mero acaso. Teria sido Augusto um iniciado?

6 de mai. de 2010

Duas notas de Bukowski

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Das "Notas de um velho safado" (Notes of a Dirty Old Man), gosto em particular de duas, logo no início. Ambas por curiosidade envolvem Jack Kerouac, autor de "On the road", associado à geração beatnik. A primeira tem como personagem Neal Cassady- justamente personagem de "On the road", como o nome "Dean Moriarty". A outra narra um encontro com Kerouac em pessoa.

Uma digressão: o triste em Kerouac é o modo como terminou. Nas palavras de Eduardo Bueno: "Jack Kerouac morreu em outubro de 1969, depois de anos sentado no sofá vendo programas de auditório na TV da casa de sua mãe (com quem morou a vida inteira), barrigudo, alcoólatra e reacionário, afastado de seus companheiros da geração beat, odiando cada cabeludo americano e se perguntando o que, afinal, havia de errado com On the road". Um final triste, como se vê, quase trágico.

O que gosto, no tipo de literatura de Bukowski, é o estilo cru e direto, underground. Não se romanceia muito: é a vida, mais precisamente a vida real, que a literatura "poliana" não mostra. É o caso de Henry Miller: às vezes pervertido, outras imoral. Escatológico também, mas, e essa é a mágica, extremamente lírico. Pura poesia no submundo, em meio a garrafas vazias, ressacas, sexo sujo, imundícies (principalmente no "Trópico de Câncer").

20 de set. de 2009

A chicotada na mesmice

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Leio sobre Claude Debussy: ao compor uma cantata, teve a obra execrada no meio musical, que lhe apontou vários defeitos. Isso levou o compositor a dizer: "Por fim escrevi algo original!".

O original é tomado por "errado", por "imperfeito", pelo mundo acadêmico, o mundo "oficial". Não é só Debussy, não é só a música que passa por isso: todo inovador recebe a pecha de "não presta" por parte das "autoridades" da matéria.

As autoridades são reacionárias. Cheiram a passado. O papel da arte deve ser a ruptura, justamente, com o passado. Maiakovsky, no poema "Verlaine e Cézanne", ao dialogar com o pintor, diz

7 de set. de 2009

Paulo Leminski

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Abaixo, meus poemas favoritos de Paulo Leminski (1944- 1989):

*

Mandei a palavra rimar,
ela não me obedeceu.
Falou em mar, em céu, em rosa,
em grego, em silêncio, em prosa.
Parecia fora de si,
a sílaba silenciosa.

Mandei a frase sonhar,
e ela se foi num labirinto.
Fazer poesia, eu sinto, apenas isso.
Dar ordens a um exército,
para conquistar um império extinto.


2 de set. de 2009

Conciliadores? Abaixo!

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Os versos abaixo são versos de tempos de lulismo, de Sarney e Collor. Escrevi rapidamente; não é preciso muita inspiração para bater nos conciliadores.

Os versos atacam os comunistas conciliadores. Lula não é comunista, claro. Mas há comunistas (!) que apóiam Lula, contra toda evidência, contra toda teoria e contra toda práxis. Mas 8 anos de Lula fizeram um favor para a esquerda, a verdadeira esquerda- separou joio do trigo, deixou claro quem é quem.

20 de ago. de 2009

Começando do começo

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Se alguém me perguntar como conhecer o marxismo, no tipo básico do básico, eu sugeriria o Manifesto Comunista, antes de tudo. Depois, uns livrinhos bem palatáveis, como, por exemplo, dois de Leandro Konder que me vêm à cabeça: "O que é dialética" e "Marx- vida e obra", cuja capa é a imagem deste post. Nada complicado, nada que entedie. Mais que ao acadêmico, é preciso falar com o militante, com o interessado nesse engajamento.

Insisto, é preciso começar pelo início, por Marx. Não cometam o equívoco de se doutrinarem com os pós-modernos, os reformistas, os revisionistas das mil e uma teses de adaptação. Isso de início destruiria o militante. Primeiro ir à fonte e, conforme se avance, conforme se tenha interesse, aí sim enveredar pelas heterodoxias. Vai que o sujeito é mesmo um heterodoxo e se sinta melhor assim- o que é um direito inalienável.

23 de set. de 2008

Versos de biblioteca

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Enquanto esperamos os livros, vem um certo tédio. A ansiedade pelo estudo, de um lado, e a monotonia da espera, de outro. Daí, aproveitando o silêncio, é possível que a musa cante despretensiosamente:

Silêncio
Zumbido chiado ar-condicionado
Vento que entra
Mulata ao lado
Que desconcerta
O Aliomar Baleeiro
Que fica
De lado.

24 de jul. de 2006

Cordialmente

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Coloco o coração como o centro de convergência da força humana. Ali, condensam-se as energias cruciais, ancestrais, primitivas, atávicas, essenciais, e também os orgasmos, os delírios, os sabores, as sensações, os ódios, os amores, os impulsos, as pulsões, os sonhos- e o que vem desse cadinho guia nossos passos, controlado, ou não, por aquela outra grande força, a do intelecto. O homem, então, é razão e emoção, num (des)equilíbrio duvidoso. Se fosse possível dizer isso, seria o coração o lar simbólico do id; é ali, e não na mente, que nosso lado animal tem lugar. O coração é fonte de poder: e isso era sabido pelos primitivos, ao comer o coração dos inimigos de guerra.

6 de jul. de 2006

Contágio

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Garaudy diz que a poesia é contagiosa. A arte é sagrada quando não nos deixa intactos, prossegue ele, de modo que no mergulho poético há o perigo de perda, de destruição, de transformação de fragmentos do ego, que serão devidamente substituídos e transformados em algo novo. O poema destrói em um primeiro momento o leitor, para reerguê-lo em seguida: e o que renasce não é o de outrora. Com efeito, que dizer de uma peça artística que nenhuma influência cause no receptor? Foi produzida debalde, perdeu-se.

Pego um livro de poemas, antigo, um tanto amarelado. Meu pai deu-me há dez anos, vejo pela dedicatória no frontispício, e já era na época um livro de segunda mão. Pego-o porque se trata de poesia contagiosa, não é um livro qualquer: abalou-me sobremaneira e ainda abala, e assim será. Falo do "Eu" de Augusto dos Anjos, poeta sobre o qual Olavo Bilac, ao ouvir alguns versos, disse que "fez bem em morrer, não se perdeu grande coisa", Augusto dos Anjos, cuja obra foi comparada com ouro, mas "ouro desperdiçado, ouro mal aplicado".

19 de jun. de 2006

Terra dos homens

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Dessa obra de Exupéry, Sartre disse capaz de levá-lo às lágrimas. Se tem tal efeito sobre um existencialista - gente nauseada da vida-, o que dirá de almas mais sensíveis e impressionáveis. Trata-se de uma ode ao ser humano, e a frase de Guillaumet, "o que eu fiz, palavra que nenhum bicho, só um homem, era capaz de fazer..." é a condensação desse espírito. Em tudo, há algo nobre; de cada ocorrido, pode-se extrair algo de útil. E os cenários que servem de pano de fundo para essas meditações! A noite do Saara, o Estreito de Magalhães, uma tenda de beduínos, os Andes chilenos, Túnis, um forte no meio do nada, um trem repleto de poloneses, um porão de anarquistas na Espanha- impossível, se tivermos em mente que são reminiscências reais, enfim, passar por essa leitura incólume.

15 de jun. de 2006

Henry Miller

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Retratar a própria vida como um romance é uma tarefa interessante. Árdua, eu diria, constrangedora, às vezes maçante. E foi isso que Henry Valentine Miller (1891-1980) fez, em seus romances autobiográficos. Há muita fantasia, decerto- e o próprio admitiu isso, mas nada que reduza em importância o esforço hercúleo que é transformar fatos banais do dia a dia em fonte de instigação mental alheia.