26 de nov. de 2010

Ainda o dogma (a propósito de hereges)

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Tenho falado muito do Orkut, em particular. Apesar das inúmeras críticas que essa ferramenta vem recebendo, ainda é, na minha opinião, a melhor rede social. Tem o Facebook, e até concordo que seja superior em muitos aspectos. Mas nisso de fomentar discussões, de juntar pessoas com interesses comuns, de disseminar informação, eu acho o Orkut melhor. Meu perfil tem quase seis anos, e a quantidade de debates -sobre os mais diversos assuntos- e pessoas diferentes que conheci é inimaginável. Sempre surge alguma coisa nova, alguma coisa interessante. Como esta fala do padre Bede Griffiths, que recebi por scrap:

Além de ser cristão, eu preciso ser um hindu, um budista, jainista, zoroastrista, sikh, muçulmano e judeu. Só assim poderei conhecer a Verdade e encontrar o ponto de reconciliação de todas as religiões... E esta revolução tem que se processar na mente do homem ocidental.

Difícil expressar a alegria que eu sinto, ao tomar conhecimento de falas como essa. Porque a minha posição -eclética, dialética, aberta- é justamente assim: a de enxergar para além da religião.

A fala do padre católico tocado pelo Hinduísmo Griffiths se assemelha -através dos séculos- com a do sábio sufi do séc. XIII Muhammad Ibn Arabi, "al-Shaykh al-Akbar", "O Mestre Supremo", uma pérola de espiritualidade e tolerância:

14 de nov. de 2010

A vitória do bonapartismo

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A História realmente se repete. O homem parece nunca aprender com os erros: avança para retroceder, olha para frente mas pelo retrovisor. É como a citação bíblica, sobre nada de novo haver sob o sol (Eclesiastes, se não me engano). O peso da tradição das gerações mortas oprime, como uma pesadelo, o cérebro dos vivos, como diz Marx. E Marx fala mais: a História, ao se repetir, o faz como farsa. Sempre uma caricatura, sempre um arremedo, grotesco -ou no mínimo ridículo- da coisa imitada. Por exemplo. Pegue-se a obra marxiana de onde foi tirada a ideia acima, o "18 Brumário". Fala das peripécias, pelo poder (acho que o poder individual é a meta de todo medíocre; ainda desenvolverei isso melhor) de Luís Bonaparte, à sombra do tio. Nessa obra há o bolsa-família, por exemplo. Não com esse nome, mas com a mesma ideia, o mesmo objetivo, o mesmo fim: a cooptação da classe trabalhadora, o "cala-boca", a política compensatória que rebaixa, e não redime.

Foi de outra forma, que o lulismo obteve em volta dos 80% de aprovação popular? O lulismo, o da reforma da previdência, das parcerias público-privadas, do aumento da participação do capital privado (estrangeiro inclusive) nas empresas públicas, o dos ruralistas como herois, o das velhas oligarquias (Collor e Sarney, por exemplo) recrudescidas. Não falo em mensalões e corrupção, "aloprados" e dinheiro em cuecas, em valeriodutos e coisas do tipo; isso tudo é inerente ao sistema. O governo melhor intencionado, neste sistema, não ficará livre disso. O que denuncia o lulismo é o neoliberalismo, aplicado nos mais diversos matizes, mascarado pelas tintas sociais que lhe deram tal índice de aprovação. O aumento no consumo é o endividamento nas Casas Bahia, o acesso ao ensino superior é o fomento aos tubarões do ensino privado enquanto se sucateia a universidade pública. E assim o lulismo vai construindo sua popularidade.

E o papel da esquerda, nesse cenário?

5 de nov. de 2010

São Jorge dos Revolucionários

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Hoje senti vontade de falar com Ogum. No início do ano passado, eu já havia escrito um post sobre sua dança. Agora sinto o Orixá de novo dançando. Desta vez na minha mente, desta vez no espaço-tempo, não mais um menino mirrado na praia de Copacabana, mas um soldado romano de capa vermelha, trajes rotos, mãos sujas de poeira e sangue. Mas o gládio brilha, reluzindo sob um sol imaginário, Jorge da Capadócia, cujo capacete também reluz, Jorge da Capadócia, dançando diante do dragão recém-vencido. Jorge dança, e o universo se torna expressão de sua dança, Jorge, que é Ogum, portanto o movimento, portanto...a dialética.

Igreja de Nossa Senhora da Lampadosa, a poucos quarteirões de distância do escritório. Naquele burburinho da Praça Tiradentes, em meio a ônibus e comércio da Avenida Passos, em meio a garotas de programa da esquina (sim, mesmo à tarde já se pode encontrá-las), em meio ao calor do horário de verão, lá está a Igreja, e é lá que, quando sinto vontade, encontro Ogum. Antes, Santo Expedito. Expeditus, soldado-lenda, santo-mito (redundância?), indicando que o momento é hoje (hodie) e não amanhã (cras). A ave negra, o corvo demoníaco, repete "cras! cras!" em nossos ouvidos, mas o santo o mantém aprisionado, sob seus pés, dominado. O hoje venceu o amanhã. Não é preciso ser católico, ou mesmo religioso, para captar o que esse romano de lenda quer nos passar, nos ensinar. O ateu "praticante" (coisa ridícula, porque o ateísmo acaba funcionando ele próprio de crença), em sua aversão, em seu pensamento binário acaba por deixar escapar essas lições, porque têm um fundo religioso. Mas tire o fundo religioso e a lição se mantém! O maior dos ateus, não fosse binário, poderia aprender com Expedito. Poderia, quando visse a imagem de Expedito -como estou vendo neste momento, enorme no altar da Igreja- identificar no corvo pisoteado todas as aspirações, todos os sonhos que, por medo e preguiça, deixamos para amanhã. E poderia ouvir o "hodie!", hoje, forte da boca do santo, convidando para a práxis . Como ouço agora. Não existindo, Expedito nos ensina mais que muitos "gurus" reais.