27 de ago. de 2009

O "não-querer" é contrarrevolucionário

É dito que a felicidade é a coincidência entre o que se VIVE e o que se DESEJA. O que se vive é objetivo; não se pode mudá-lo pela força de vontade (falamos disso em Base e superestrutura. E Chopin). Mas a sua identidade com aquilo que queremos é, se não impossível, raro. Como evitar a infelicidade, então, já que não podemos mudar a realidade objetiva? A solução seria não desejar. A saída budista, que vê no "apego" a raiz do sofrimento.

O que pega aí é que, penso eu, sem DESEJO, o mundo não avança.

Já falamos: o problema material deve encontrar uma solução material. Mas é o impulso, vale dizer, a vontade de homens conscientes que criará a solução. O "não-querer" é a inação. O universo não é estático- avança, avança, quando pára de andar é porque morreu, como diz Engels no "Anti-Dühring".

O "não-querer" é, penso eu, contrarrevolucionário.

Mas e sofrer? Se se quer e não se tem?

Maiakovsky, sobre o coração:

Nos demais
- eu sei,
qualquer um o sabe -
O coração tem domicílio
no peito.
Comigo
a anatomia ficou louca.
Sou todo coração -
em todas as partes palpita.
Oh! Quantas são as primaveras

em vinte anos acesas nesta fornalha!

Uma tal carga
acumulada torna-se
simplesmente insuportável.

Insuportável

não para o verso

deveras
.

Há que querer. Mesmo que não se consiga. Há que querer. Quero.

*

Mas, por pura provocação dialética, a imagem do post será Fernando Pessoa que, como Alberto Caeiro, disse exatamente o contrário:

Se eu morrer muito novo, ouçam isto:
Nunca fui senão uma criança que brincava.

Fui gentio como o sol e a água,

De uma religião universal que só os homens não têm.

Fui feliz porque não pedi coisa nenhuma,

Nem procurei achar nada,

Nem achei que houvesse mais explicação

Que a palavra explicação não tem sentido nenhum.

Não desejei senão estar ao sol
ou à chuva
— Ao sol quando havia sol
E à chuva quando estava chovendo
(E nunca a outra cousa),

Sentir calor e frio e vento,
E não ir mais longe.

3 comentários:

  1. Reflexiva sua explanação. Freud dizia: “O desejo é a falta”. Na vida estamos sempre procurando conquistar algo mais, isso é fato, e não vai mudar. No entanto devemos nos ater a advertência de Vicente de Carvalho, a respeito da FELICIDADE, quando disse:

    “Essa felicidade que supomos/
    Árvore milagrosa que sonhamos/
    Toda arredada de dourados pomos/
    Existe sim: mas nós não a alcançamos,/
    Porque está sempre apenas onde a pomos/
    E nunca a pomos onde nós estamos”.

    Grande abraço Tejo... Desejo-te muitas felicidades!!

    Marli

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  2. Muito bom, Marli. Talvez esse assunto acabe por se relacionar com a questão do "O velho e o mar", que debatemos. A felicidade deve estar não no peixe, e sim na pescaria.

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  3. Voce tem razão, esse assunto está ligado àquela questão sim. Reforçando suas palavras – “O prazer está no ‘percurso’ (pescaria), e não no ‘objetivo’ (peixe)”. De repente nos deparamos com a felicidade em uma das subidas ou descidas que farão parte de nossa caminhada, e não exatamente na linha de chegada. Abs...

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