8 de dez. de 2009

Trotsky Futebol Clube

Nos fóruns de debate da vida, a distensão Trotsky x Stálin é sempre tratada de forma antimarxista, isto é, subjetivamente. Trotsky, coitado, é odiado- perguntem o porquê, não sabem responder. Ou utilizam chavões, rótulos e deturpações, muito ao gosto do "Guia Genial dos Povos". Segue abaixo uma desinteressada defesa da História, logo, de Trotsky. A parte inicial, sobre "avatares de Stálin", remete a um debate no Orkut, nada que interfira na compreensão do post.

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Usando uma metáfora futebolística.

Suponhamos que alguém ingressasse, nesta comunidade, com um avatar do FLUMINENSE, e abrisse um tópico sobre a, digamos, canalhice do FLAMENGO. Isto é, o autor do tópico lera um tópico de um autor TRICOLOR, que ataca o FLAMENGO, e vem aqui postar como se fosse a verdade absoluta. Ou, de outra mão, um autor FLAMENGUISTA, ao ler um livro contra o FLUMINENSE, vem atacá-lo aqui na comunidade.

A comparação com o futebol, se é pueril, por outro lado é pertinente. Afinal, a questão Stálin x Trotsky tem sido tratada -há décadas- dessa forma, como briga de torcidas.

O uso de um avatar de Stálin desqualifica totalmente o debate ab initio- pois o debatedor já deixou clara sua opção, já deixou claro sob qual prisma ele enxerga essa distensão. Não esperemos de alguém que usa um avatar do FLUMINENSE menções elogiosas ao FLAMENGO, ao contrário, ele mostra, ao usar aquele avatar, de que lado se posiciona. Por outro lado, não vi ninguém aqui com avatares de Trotsky.

A análise marxista é científica, portanto não pode sofrer inflexões de ordem pessoal e/ou subjetivas. A partir do momento que "paixões clubísticas" tomam conta do debate, a dialética morre.

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O método dialético é movido, antes de mais nada, pela aceitação das contradições. É através delas que a dialética se move.

Já o stalinismo é o oposto. É uma mentalidade binária e reducionista.

Diz Leandro Konder: "Stálin pensava da seguinte maneira: Zinoviev, Kamenev, Trotsky, Bukhárin e outros têm opiniões "erradas" a respeito de questões importantes; expondo suas opiniões, defendendo-as, eles produzem efeitos daninhos, objetivamente tão nocivos como os efeitos que seriam provocados pela ação de sabotadores, espiões, agentes contrarrevolucionários e traidores; portanto, objetivamente, eles são sabotadores, espiões, traidores, agentes inimigos- e precisam objetivamente ser tratados como tais".

Konder prossegue: "Para se ter uma idéia de como esse modo de pensar e de agir era diferente do de Lênin, basta lembrarmos que Zinoviev, Kamenev, Trotsky e Bukhárin divergiram de Lênin em questões importantíssimas e nem por isso Lênin os liquidou".

Aceitar o pensamento oposto é marxista. Encará-lo como inimigo, "bobo, feio e mau", é stalinista.

O stalinismo pensa assim:

a) A burguesia ataca Stálin.

b) Trotsky ataca Stálin.

LOGO (sic),

c) Trotsky é.....a burguesia!!!

Só o pior dos sofistas para desenvolver tal "brilhante" construção teórica.

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A análise de Trotsky pelos stalinistas é tão primária que até de não ter tido importância para o movimento comunista internacional ele é acusado. Esquecem que ele sempre ocupou postos-chave na política soviética.

O próprio Trotsky, falando de si mesmo, lembra aos detratores: "The author of this book [NOTA MINHA: o "História da Revolução Russa"] was president of the Petrograd Soviet after the Bolsheviks won a majority there, and he was afterward president of the Military Revolutionary Committee which organized the October uprising. These facts he neither wishes nor is able to erase from history. The faction now ruling in the Soviet Union has of late years dedicated many articles, and no few books, to the author of this work, setting themselves the task of proving that his activity was steadily directed against the interests of the revolution. The question why the Bolshevik party placed so stubborn an “enemy” during the most critical years in the most responsible posts remains unanswered. To pass these retrospective quarrels in complete silence would be to renounce to some extent the task of establishing the actual course of events. And to what end? A pretense of disinterestedness is needful only to him whose aim is slyly to convey to his readers conclusions which do not flow from the facts. We prefer to call things by their whole name as it is found in the dictionary".

Isto é, Trotsky foi:

- Presidente do Soviete de Petrogrado, sob a maioria bolchevique;

- Presidente do Comitê Revolucionário que organizou o levante de Outubro.

Como podem falar que esse revolucionário não foi importante para o movimento comunista? Ou, ser equiparado a....Roberto Freire???

Acrescento que Trotsky foi ainda Comissário do Povo para Negócios Exteriores, Comissário do Povo para a Guerra (criando aí o Exército Vermelho) e ainda ocupou uma pasta científica já perto de seu exílio.

São fatos que, como dito no trecho acima, não podem "ser apagados da História".

Por mais que o stalinismo queira.

No mesmo trecho, Trotsky lembra que o poder dirigente na URSS insiste em difamá-lo e detratá-lo, para então lançar a pergunta perturbadora (para os detratores): se ele, Trotsky, era tão ardente "contrarrevolucionário", por que diabos o Partido Bolchevique colocaria tão encarniçado "inimigo" em tão importantes cargos?

Há uma nota de comicidade aqui. Os stalinistas fazem de Lênin um sujeito parvo, simplório. Uma espécie de "Forrest Gump" russo. Afinal, Lênin estava cercado de inimigos por todos os lados e....não tinha a menor noção disso! Bukhárin ("o preferido do Partido"). Kamenev, Zinoviev (que como disse Lunatcharsky, era o "mais fiel seguidor de Lênin"), Trotsky, eram todos...TRAIDORES! Só Koba que não. Apenas Koba era bom, justo, reto, fidedigno, o ÚNICO de todos os bolcheviques que não era traidor.

É engraçado. Mas engraçado tipo "rir pra não chorar".

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Sobre Trotsky ser "contra" (sic) a URSS na 2ª Guerra, já coloquei textos aqui.

"A defesa da URSS, para nós, coincide com a preparação da revolução mundial. Somente aqueles métodos que não entrem em conflito com os interesses da revolução são admissíveis. A defesa da URSS está ligada à revolução socialista mundial, assim como uma tarefa tática está ligada a uma estratégia. Uma tática está subordinada a um fim estratégico e de forma nenhuma pode entrar em contradição com este último". ("A URSS na guerra").

A questão é clara, e só não é enxergada por quem analisa a questão do ponto de vista pessoal. A crítica de Trotsky era contra a burocracia, e não contra o Estado soviético. São duas instituições que não se confundem. Dizer o contrário, é dizer que "O governante É o Estado" e, não por acaso, isso já é premissa do fascismo.

Gosto de um exemplo que costuma desconcertar os stalinistas.

Quem era contra Médici era contra o Brasil? Criticar Pinochet era criticar o Chile?

Por que criticar Stálin seria...ser contra a URSS?

Não estou comparando Stálin com Médici nem com Pinochet. Mas pequenas "pegadinhas" como essa bastam para mostrar como os stalinistas não podem sustentar, de forma dialética, seu pensamento.

(será por isso que os stalinistas recorrem à força?)

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Como esse debate se dá no nível infrarracional, o melhor argumento é inútil. O sujeito gosta de azul porque não gosta de verde; pena que uma questão histórica seja reduzida a preferências de gosto.

5 comentários:

  1. O time de Trotsky fez um bom ataque neste post. O gol saiu nesta afirmação: /Aceitar o pensamento oposto é marxista/ Gostei, então – 1 x 0. E Cartão Vermelho para o Stalin por / Encará-lo como inimigo, bobo, feio e mau/.

    Claro que é preciso pesar que a partida é narrada por um “Trotskyano”... rs Mas tenho que admitir que foi uma boa defesa do time.

    Criativa explanação.

    Abs. Marli

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  2. Caraca Tejo, não pra ler esse texto em 5 minutos de intervalo do trabalho. A barra de rolagem deu umas oito rodadas do mouse. Mas blz, vou ler com calma depois pra ver quanto ficou a partida.

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  3. bem que tentei..

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  4. eu axei um texto muito bem escrito e fala a verdade

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  5. Eu aprecio muito a figura de Leon Bronstein, vulgo Trótsky. Não sou trotskista, porque uma coisa é a figura de Trótsky e outra seus seguidores.

    Sempre fui da opinião que o maior inimigo da União soviética foi Stálin. Ele sim, fez o jogo da burguesia, como bem explanou George Orwell em seu opúsculo, "A Revolução dos Bichos".

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