É o título de um artigo de Simón Bolívar, escrito no primeiro semestre de 1829. Tantas lutas, tantas abnegações e dores- e o cenário é desolador. A situação na Argentina é atroz; falando sobre seu sistema pós-independência, diz: "Turvam-se as eleições com tumultos e intrigas (...) Tudo é decidido pela força, o partido ou o suborno; com quais objetivos? Para mandar por um instante, entre os alarmes, os combates e os sacrifícios (...) Eram raras as eleições em que não interviessem desordens espantosas". E a Argentina não era a única com tais mazelas, como o próprio Libertador ressalta. "Em lugar nenhum as eleições são legais, em nenhum o mando é sucedido pelos eleitos segundo a lei". Enquanto na Argentina a anarquia se perpetua, o Chile e a Guatemala escandalizam; a "infeliz Bolívia" tem quatro chefes diferentes em menos de duas semanas, e "os horrores mais criminosos inundam aquele belo país", o México. Enfim: "Esta é, americanos, nossa deplorável situação".
É como se os povos, recém-emancipados, no gozo de sua liberdade tão dificilmente conquistada, não quisessem- ou não soubessem- fazer uso dela. O jugo espanhol durou 300 anos. Muitos grilhões e cadeias foram arrastados ao longo desses séculos; quanta exploração, e espólio, e roubo, a metrópole não nos impôs a nós, latinoamericanos, e agora, finalmente, somos livres. Mas, pra quê? Para que cada caudilho se levante, cada chefete reparta o território, e para que o espólio e o roubo se perpetuem ad eternum? Não é mais a linhagem de Carlos V que subjuga. É um fratricídio, americano subjugando americano. "Teria valido a pena lutar?", pode se perguntar o Libertador, melancólico, observando o desfecho de sua gloriosa luta pela emancipação.
O resultado, à primeira vista, das revoluções latinoamericanas de libertação, pode dar margem a vieses pessimistas. É a mesma colocação que já vi ser feita quanto a George Orwell e sua "Revolução dos Bichos": com o soçobro da revolução, na obra, fica provado que não vale a pena lutar. A mensagem é clara, submetam-se. Independência pra quê, se dará errado? E os reacionários abrem largos sorrisos.
Mas a questão é muito mais complexa que isso. A uma, porque o conceito de "soçobro" é relativo no que tange à construção da História por seres humanos (êxito, fracasso, onde está um e onde outro?, pode-se qualificar adequadamente, ou mesmo quantificar, os resultados da experiência humana?), a duas, porque há situações em que o risco, decididamente, vale a pena. A frase de Fidel Castro, sobre ser preferível morrer em pé a viver de joelhos, tem plena aplicação aqui, e é repleta de significado.
A roda da História não pára. Os homens fazem seu trajeto (não com absoluta liberdade, é verdade, mas como diz Marx no "18 Brumário", influenciados pelas condições legadas) e, no desenvolver desse trajeto, acerta-se, erra-se, mas, enfim, a História é construída. O caos primordial da América Latina recém-libertada foi superado. O trabalho -vale dizer, a revolução- contudo, não cessa. Ainda há que se combater oligarquias, denunciar abusos. Tronos a serem derrubados, cabeças coroadas a serem derrotadas. O inimigo essencialmente é o mesmo, mas adota novas aparências, novos nomes, e tem a forma de um sistema econômico baseado na competição e na apropriação do trabalho alheio. O Libertador se faz necessário, ainda: tomando-lhe o exemplo, e sem medo de errar, façamos o Novo, de fato, o Novo Mundo.
É como se os povos, recém-emancipados, no gozo de sua liberdade tão dificilmente conquistada, não quisessem- ou não soubessem- fazer uso dela. O jugo espanhol durou 300 anos. Muitos grilhões e cadeias foram arrastados ao longo desses séculos; quanta exploração, e espólio, e roubo, a metrópole não nos impôs a nós, latinoamericanos, e agora, finalmente, somos livres. Mas, pra quê? Para que cada caudilho se levante, cada chefete reparta o território, e para que o espólio e o roubo se perpetuem ad eternum? Não é mais a linhagem de Carlos V que subjuga. É um fratricídio, americano subjugando americano. "Teria valido a pena lutar?", pode se perguntar o Libertador, melancólico, observando o desfecho de sua gloriosa luta pela emancipação.
O resultado, à primeira vista, das revoluções latinoamericanas de libertação, pode dar margem a vieses pessimistas. É a mesma colocação que já vi ser feita quanto a George Orwell e sua "Revolução dos Bichos": com o soçobro da revolução, na obra, fica provado que não vale a pena lutar. A mensagem é clara, submetam-se. Independência pra quê, se dará errado? E os reacionários abrem largos sorrisos.
Mas a questão é muito mais complexa que isso. A uma, porque o conceito de "soçobro" é relativo no que tange à construção da História por seres humanos (êxito, fracasso, onde está um e onde outro?, pode-se qualificar adequadamente, ou mesmo quantificar, os resultados da experiência humana?), a duas, porque há situações em que o risco, decididamente, vale a pena. A frase de Fidel Castro, sobre ser preferível morrer em pé a viver de joelhos, tem plena aplicação aqui, e é repleta de significado.
A roda da História não pára. Os homens fazem seu trajeto (não com absoluta liberdade, é verdade, mas como diz Marx no "18 Brumário", influenciados pelas condições legadas) e, no desenvolver desse trajeto, acerta-se, erra-se, mas, enfim, a História é construída. O caos primordial da América Latina recém-libertada foi superado. O trabalho -vale dizer, a revolução- contudo, não cessa. Ainda há que se combater oligarquias, denunciar abusos. Tronos a serem derrubados, cabeças coroadas a serem derrotadas. O inimigo essencialmente é o mesmo, mas adota novas aparências, novos nomes, e tem a forma de um sistema econômico baseado na competição e na apropriação do trabalho alheio. O Libertador se faz necessário, ainda: tomando-lhe o exemplo, e sem medo de errar, façamos o Novo, de fato, o Novo Mundo.
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